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TAXONOMIA: A CIÊNCIA DE DAR NOMES AOS ORGANISMOS

Atualizado: 18 de mai. de 2020


Texto: Bruno Corrêa


Uma breve história dos nomes.


A linguagem é um fenômeno incrível! A partir do estabelecimento de formas de comunicação em uma sociedade nós fomos capazes de nos expressarmos, de promover uma organização social e transmitir conhecimentos pelas gerações seguintes. Foi assim que definimos o que é perigoso, o que podemos comer e como nos diferenciar como indivíduo dentro dos grupos. Ou seja, nomear as coisas sempre foi e sempre será algo importante para a humanidade.


Alguns nomes já são amplamente conhecidos em diversas regiões ou culturas, como “cachorro”, “gato” ou “morcego”. Eles se estabeleceram pelo convívio das pessoas com esses animais, que passaram a identificá-los facilmente. Alguns animais e plantas recebem nomes populares específicos, exemplos disso são a onça-pintada (Panthera onca) e o ipê-amarelo (Handroanthus albus). Entretanto, outros organismos possuem um problema, pelo menos do ponto de vista da organização das espécies, quando um único nome popular é usado para uma variedade grande de espécies. Isso acontece, por exemplo, com as serpentes corais, que na verdade são mais de 15 espécies diferentes agrupadas sob um mesmo nome popular.


Nós temos uma diversidade absurda de formas de vida no planeta Terra, mas você já parou para pensar em como podemos organizar e padronizar o agrupamento de todos esses organismos? As tentativas de classificação dessa biodiversidade são antigas e muitas propostas surgiram desde a época de Aristóteles, que sugeriu a existência de dois grandes reinos, dos animais e das plantas, até as mais recentes, que são baseadas em dados genéticos e populares. Hoje temos em torno de dois milhões de espécies descritas de procariotos e eucariotos, mas estimamos que exista mais que o dobro de espécies no mundo que ainda não foram descobertas pelos taxonomistas e que talvez nem serão, por serem difíceis de se encontrar ou que serão extintas mesmo antes de conhecermos.


Nomenclaturas na ciência

A área da biologia que é responsável por dar nome aos seres vivos é chamada de Taxonomia, mas você sabe como ela surgiu? Os trabalhos do naturalista sueco Carolus Linnaeus (Figura 1) foram o ponto de partida, principalmente com a publicação em 1735 de sua obra Systema Naturae, onde é sugerido o uso de nomes binomiais para as espécies. Algumas premissas foram importantes para a implementação desse sistema, como a própria existência de uma relação de parentesco entre as espécies, que na época era inferida puramente a partir de dados morfológicos. As descrições anatômicas das espécies era a forma como os naturalistas podiam agrupar ou separar os organismos em grupos, ou seja, levando em conta os quão parecidos ou diferentes eles eram uns dos outros. As primeiras descrições e, principalmente a interpretação desses dados, foram limitadas ao seu tempo justamente pelo fato de Linnaeus ter feito sua obra antes de outros grandes nomes da biologia, como Darwin, Wallace e Gregor Mendel, sem ter, portanto, o embasamento evolutivo, genético e ecológico que seguimos atualmente. Hoje em dia, a biologia segue uma série de regras firmemente estabelecidas e que se adequam à cada grupo que está sendo estudado, como o Código Internacional de Nomenclatura Zoológica (ICZN), o Código Internacional de Nomenclatura para Algas, Fungos e Plantas (ICN), o Código Internacional de Nomenclatura de Procariotas (ICNP) e o Código Internacional para Nomenclatura e Classificação de Vírus (ICVCN).


Figura 1: Pintura de Carolus Linnaeus. Fonte: New Scientist Ltd.


O código zoológico foi criado no XV Congresso Internacional de Zoologia, em 1958, realizado em Londres. Para reger o código foi estipulada a Comissão Internacional de Nomenclatura Zoológica, que estabelece a prioridade das nomenclaturas e organiza quais são os nomes que devem ser usados. Algumas regras criadas por Linnaeus ainda permanecem válidas, enquanto outras foram adaptadas, como:

  • As espécies possuem dois nomes, o genérico (nome do gênero da espécie) e o epíteto específico, respectivamente (Figura 2);

  • Havendo subespécies, estas terão trinômio, como por exemplo: Boa constrictor occidentalis;

  • O nome das espécies deve ser em latim ou latinizados, podendo haver homenagens a pessoas;

  • Os nomes científicos devem estar destacados, seja em itálico ou sublinhados (no caso de manuscritos);

  • Após o nome da espécie devem seguir o nome do autor ou dos autores que a descreveram, caso a espécie tenha sido alocada em outro gênero esses autores devem estar em parênteses (Figura 2);

  • Após a autoria da descrição deve seguir o ano da publicação;

  • Caso a homenagem seja a um homem, o epíteto deve finalizar em “i” (ex: Rhinella mirandaribeiroi) e se for a uma mulher deve terminar em “ae” (ex: Boana ericae);


Essas e outras regras podem ser encontradas no próprio site do ICZN, https://www.iczn.org/.


Figura 2: Exemplo da nomenclatura binomial proposta por Linnaeus.


Curiosidades

Algumas espécies reservam uma história nas suas descrições bastante interessantes, seja na homenagem ou até na morfologia utilizada para batizar a espécie. Então senta que lá vem história:

  1. Boana albopunctata – Essa espécie é conhecida popularmente como perereca carneiro por conta da sua vocalização. Foi descrita em 1824 pelo pesquisador Johann Spix, o engraçado é que o termo “albopunctata” significa pontos (punctata) branco (albo), porém esse animal possui pontos amarelos em vida, mas Spix descreveu apenas com indivíduos coletados e o processo de fixação retira a pigmentação fazendo os pontos ficarem esbranquiçados;

  2. Lachesis muta – A famosa surucucu-pico-de-jaca também possui um causo bom, essa espécie foi descrita por ninguém menos que Linnaeus em 1766, mas entrou no gênero Crotalus, que são das cascavéis, pois segundo ele quando se aproximava dela, mexia a cauda freneticamente no folhiço, porém sem fazer o som do chocalho. Por isso o epíteto específico era mutus que significa muda, ou seja, uma cascavel muda;

  3. Bokermannohyla oxente – Algumas descrições também levam em conta a distribuição da espécie, no caso da B. oxente você já deve imaginar de onde ela é. Nordestina de corpo e alma, essa perereca faz referência ao nordeste brasileiro e a forma que as pessoas usam esse termo “oxente!”.


E você, conhece alguma história taxonômica legal? Conte-nos nas nossas redes sociais!


Referências

Breitman, M. F., Domingos, F. M., Bagley, J. C., Wiederhecker, H. C., Ferrari, T. B., Cavalcante, V. H., ... & Del Prette, A. C. (2018). A New Species of Enyalius (Squamata, Leiosauridae) Endemic to the Brazilian Cerrado. Herpetologica, 74(4), 355-369.

Brusca, R.C., Moore, W., Shuster, S.M. 2018. Invertebrados. 3ª Edição. Editora Guanabara Koogan, Rio de Janeiro.

Gittleman, J. L. (2019). Species. Encyclopaedia Britannica. Disponível em: https://www.britannica.com/science/species-taxon Acesso em 06 de abril de 2020.

https://www.iczn.org/about-the-iczn/

Linnaeus, C. (1758). Systema naturae (Vol. 1, No. part 1, p. 532). Laurentii Salvii: Stockholm.

Lugli, L., & Haddad, C. F. (2006). A new species of the Bokermannohyla pseudopseudis group from central Bahia, Brazil (Amphibia, Hylidae). Herpetologica, 62(4), 453-465.

Müller-Wille, S. (2020). Carolus Linnaeus. Encyclopaedia Britannica. Disponível em: https://www.britannica.com/science/species-taxon Acesso em 13 de abril de 2020.

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