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SÓ SE ESCONDER FUNCIONA?


Texto: Bruno Corrêa


Quais são os métodos de defesa dos anuros?

Sempre que vemos um documentário de vida silvestre na TV, temos aquela imagem clássica da leoa correndo atrás de uma zebra ou lagarto fugindo de uma cobra ou ainda uma onça saltando em um jacaré! Ok, mas o que todas essas cenas tem em comum? Um evento de tentativa ou sucesso de uma predação. Se refletirmos um pouco mais, essas cenas, em realidade, são o resultado de milhões de anos de evolução dessas e/ou de outras espécies na “corrida bélica”, entre presas e predadores na luta pela sobrevivência.


Ou seja, a busca pela sobrevivência não ocorre apenas com mamíferos ou répteis, mas com todos os grupos de seres vivos ou não vivos (ex.: vírus).Isso mesmo, em alguns grupos animais surgiram e se aperfeiçoaram diversos métodos de caça ou de defesa. Dentre estes, os anuros são um grupo animal que por serem fonte de alimentação para vários carnívoros, desenvolveram uma vasta gama de estratégias de defesa para evitar alguma das fases da predação: localização, identificação, abordagem, subjugação, ingestão e digestão (Toleto et al., 2011).


Mas o que realmente as presas podem fazer nessas fases para evitar a sua predação?

Vamos exemplificar uma por uma:


I. Localização. Evitar essa fase, significa que o predador não conseguirá distinguir o anuro do ambiente. Assim, observamos muitas vezes a camuflagem sendo utilizada. Contudo, temos também um método muito interessante chamado “comportamento rígido”, do inglês “Stiff-legged behaviour”, que o sapo-folha Procerathoprys boiei realiza para evitar a sua localização esticando seus membros, camuflando-se com o ambiente (Costa et al., 2009).


II. Identificação. Algumas espécies indicam para os seus possíveis predadores que são perigosos ou indigestos, mostrando suas partes aposemáticas (normalmente são cores vivas que se destacam do ambiente para alertar o predador). Um método descrito é o entrelaçar de pernas, do inglês “Legs-interweaving”, que algumas espécies, como a perereca Agalychnis aspera, cruzam seus membros anteriores no dorso, destacando assim a sua coloração aposemática(Gally et al., 2014).


III. Abordagem. Neste caso, as presas evitam a sua captura através de comportamentos eficientes, movimentando-se rápido, saltando ou secretando substâncias escorregadias ao longo do corpo.


IV. Subjugação. Ao ser apanhado pelo predador, a presa apresenta-se intragável (impalatável) ou difícil de se engolir, são algumas tentativas para a sobreviver à ameaça do predador. Por exemplos, a tanatose (fingir de morto para o predador perder o interesse), inchar o corpo (para aumentar o tamanho e parecer ameaçador) (Figura 1A e B), e muitos outros comportamentos descritos na literatura.


V. Ingestão. Dificultar a ingestão pode ser feito de diversas formas, dentre elas a contração (Figura 2) e o inchaço do corpo (Toledo et al., 2011).


VI. Digestão. E, por fim, após a fase da ingestão, a produção de toxinas é um recurso amplamente utilizado pelos anuros, concentrando-as em locais específicos, como nas glândulas paratóides ou ao longo do corpo (Figura 3), a fim de promover a regurgitação do predador.


Figura 1. A) Individuo de Odontophrynus cultripes ao ser manuseado, inchou o corpo; B) Indivíduo de Physalaemus nattereri fazendo display defensivo mostrando ser maior e seus ocelos. Fotos: Bruno Corrêa.


Bom, agora que já exemplificamos cada fase da predação, vamos continuar...

Atualmente temos mais de mil espécies de anuros no Brasil (Segalla et al., 2019), somos campeões em diversidade biológica e já pensou na quantidade de métodos que essas espécies podem usar para evitarem serem predadas? Hoje, nós reconhecemos 30 tipos diferentes de estratégias de defesa (Toledo et al., 2011), mas ao longo dos anos mais informações vão sendo publicadas, como subcategorias ou novas estratégias (Toledo et al., 2010; Gally et al., 2014). Mesmo assim, o método mais observado é o simples “cair fora” (correr muito!) seguido por ficar imóvel e inchar o corpo (Toledo et al., 2011).


Um método comum e bastante conhecido é a tanatose, como já explicamos, originária do grego Thanatos (personificação da morte), tratando-se de um display de “aparente morte” (simulando), realizada não somente pelos anuros também ocorre em outros grupos animais, como em alguns répteis. Outra estratégia interessante é a contração corporal nas pererecas da Família Phyllomedusidae, onde várias espécies fazem o “body shrinking”, que é o ato de contrair a cabeça e juntar ao corpo os membros posteriores e anteriores, podendo até, em algumas espécies, mudar a coloração do indivíduo, visando esconder as suas partes coloridas e se camuflar com o substrato (Figura 2) (Borteiro et al., 2014).


Figura 2. Método de defesa "bodyshrinking". A) Indivíduo de Phyllomedusa paliata; B) Indivíduo de Phyllomedusa tomopterna. Fotos: A) Afonso S. O. Meneses e B) Bruno Corrêa.


Figura 3. A) Glândulas paratóides indicadas pelas setas vermelhas no sapo cururu, Rhinella cerradensis; B) Glândulas de veneno ao longo do corpo do sapo indicadas por setas vermelhas de um Odontophrynus cultripes. Fotos: Bruno Corrêa.


De fato, esse assunto é importante não só para entendermos hoje a história natural das espécies, visto que evidenciamos alguns dos padrões de métodos defensivos grupo dos anfíbios, mas também para entendermos como elas se relacionam em suas histórias evolutivas. E você, já presenciou ou soube de alguma outra forma de sobrevivência desses pequenos e interessantes seres?


Referências:

Borteiro, C., Baldo, J. D., Kunz, T. S., Perez, R., Petry Eltz, R., & Kolenc, F. (2014). Contracting behaviour in three species of Phyllomedusa (Anura: Hylidae: Phyllomedusinae). Herpetology Notes, 7, 393-395

Costa, P. N., Silva-Soares, T., & Bernstein, L. B. (2009). Defensive behaviour of Proceratophrys boiei (Wied-Neuwied, 1824) (Amphibia, Anura, Cycloramphidae). Herpetology Notes, 2(1), 227-229.

Gally, M., Zina, J., de Mira-Mendes, C. V., & Solé, M. (2014). Legs-interweaving: An unusual defense behaviour of anurans displayed by Agalychnis aspera (Peters, 1983). Herpetology Notes, 7, 623-625.

Segalla, M. V., Caramaschi, U., Cruz, C. A. G., Garcia, P. C. A., Grant, T., Haddad, C. F. B., Santana, D. J., Toledo, L. F. & Langone, J. A. (2019). Brazilian Amphibians:

List of Species. Herpetologia Brasileira, vol. 8 Nº 1.

Toledo, L. F., Sazima, I., & Haddad, C. F. (2010). Is it all death feigning? Case in anurans. Journal of Natural History, 44(31-32), 1979-1988.

Toledo, L. F., Sazima, I., & Haddad, C. F. (2011). Behavioural defences of anurans: an overview. Ethology Ecology & Evolution, 23(1), 1-25.

Toledo L.F., Silva R.R. & Haddad C.F.B. (2007). Anurans as prey: an exploratory analysis and size relationships between predators and their prey. Journal of Zoology 271: 170–177.


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