top of page

PARECE, MAS NÃO É: ESTRATÉGIAS DE DEFESA EM Diploglossus fasciatus (GRAY, 1831)

Texto: Débora Cristina B. M. de O. Santos


Imagine ser um pequeno lagarto vivendo no chão da floresta. Assim como você, outros animais maiores precisam se alimentar e você pode ser a próxima presa. Como evitar isso? Estratégias de defesa contra predadores.


Um predador precisa identificar sua presa, perseguí-la e capturá-la. Para cada uma destas fases a presa pode exibir diferentes estratégias de defesa. Vem descobrir como a rara espécie Diploglossus fasciatus (GRAY, 1831) faz para não virar o próximo lanche.

Figura 1. Diploglossus fasciatus, Bolívia. A) Juvenil. Autoria: Darwin Sevillano. B) Macho adulto. Autoria: Mileniusz Spanowicz/WCS. Imagens retiradas e modificadas de Domic et al. (2015).


Diploglossus fasciatus é um lagarto de corpo alongado e cilíndrico que habita regiões da Amazônia e Mata Atlântica. Os juvenis apresentam coloração diferente da do adulto (Figura 1), exibindo um padrão listrado preto e branco. Essa coloração mimetiza (imita) uma espécie de milípede que produz substâncias nocivas como defesa. Quando um predador avista um indivíduo de D. fasciatus, o confunde com o milípede e não o captura. É uma estratégia que evita a identificação da presa pelo predador.


Durante a tentativa de captura, D. fasciatus pode ainda abrir a boca para intimidar o predador. Se capturado, pode morder e girar o corpo para se soltar. Outra forma de se evitar a captura é a fuga, muitas vezes se escondendo em algum abrigo de difícil acesso ao predador. Quando em fuga, D. fasciatus posiciona os membros junto ao corpo e se move como uma serpente, ondulando o corpo (Figura 2).

Figura 2. Postura de fuga em D. fasciatus. Autoria: tvbr (cortada), CC BY-NC 4.0.


Lagartos com as características de D. fasciatus (corpo cilíndrico e alongado, com membros curtos, reduzidos ou inexistentes) são organismos modelo para o estudo da evolução das serpentes. As serpentes são, na verdade, um grupo de lagartos ápodos (sem membros). Sim, toda serpente é um lagarto, mas nem todo lagarto é uma serpente.


Organismos que possuem a forma corporal alongada muitas vezes são confundidos com serpentes. Inclusive existe um mito sobre uma espécie congenérica (mesmo gênero) de D. fasciatus, D. lessonae, que ocorre na Caatinga. Os habitantes da região acreditam que D. lessonae se transforma em cobra conforme cresce, provavelmente devido ao corpo crescer mais rápido do que seus membros.


Infelizmente, muitas pessoas matam serpentes por medo, e animais que possuem corpo serpentiforme podem cair nessa conta. Diploglossus fasciatus é uma espécie rara, com pouquíssimos estudos sobre sua biologia e ecologia. Sequer sabemos seu modo reprodutivo (se é ovípara ou vivípara). Será que ela consegue se defender do ser humano?


Referências

ÁVILA-PIRES, T. C. S. Lizards of Brazilian Amazonia (Reptilia: Squamata). Zoologische Verhandelingen, v. 299, n. 1, p. 1–706. 1995.

DOMIC, E.; MARTÍNEZ, J.; SPANOWICZ, M.; WALLACE, R. B. Diploglossus fasciatus Gray, 1831 (Diploglossa: Anguidae): primer registro para el Parque Nacional y Área Natural de Manejo Integrado Madidi. Cuadernos de Herpetología, v. 1, n. 29, p. 99–100. 2015.

MARQUES, O. A. V.; SAZIMA, I. História natural dos répteis da Estação Ecológica Juréia-Itatins. In: MARQUES, O. A. V.; DULEBA, W. (eds.). Estação Ecológica Juréia-Itatins: ambiente físico, flora e fauna. Ribeirão Preto: Holos Editora, 2004. Cap 22, p. 257–277.

McELROY, E. J. Antipredator behavioral mechanisms: avoidance, deterrence, escape, and encounter. In: BELS, V. L.; RUSSELL, A. P. (eds.). Behavior of lizards: evolutionary and mechanistic perspectives. Boca Raton: CRC Press, 2019. Cap. 5, p. 143-174.

MIRANDA, R. B. Estratégias de defesa, sequências de extinção e adaptações locais em lagartos: o caso das ilhas artificiais da represa de Serra da Mesa, Norte de Goiás, Brasil. 2021. 113 p. Tese (Doutorado em Zoologia) - Instituto de Ciências Biológicas, Universidade de Brasília, Brasília, 2021.

MORINAGA, G.; BERGMANN, P. J. Evolution of fossorial locomotion in the transition from tetrapod to snake-like in lizards. Proceedings of the Royal Society B, v. 287, n. 1923, p. 1–6. 2020.

SANTOS, J. L.; COSTA, H. C.; MOLINA, F. B. The curse of being serpentiform: perceptions of snakelike animals in São Paulo, Brazil. Ethnobiology and Conservation, v. 9, n. 27, p. 1–14. 2020.

VANZOLINI, P. E.; RAMOS-COSTA, . M. M.; VITT, L. J. Répteis das caatingas. Rio de Janeiro: Academia Brasileira de Ciências, 1980.

VITT, L. J.; CALDWELL, J. P. Herpetology: an introductory Biology of amphibians and reptiles. 4 ed. San Diego: Academic Press, 2014.

WIENS, J. J.; SLINGLUFF, J. L. How lizards turn into snakes: a phylogenetic analysis of body-form evolution in anguid lizards. Evolution, v. 55, n. 11, p. 2303–2318. 2001.

1.419 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page