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MEDO DE COBRA, VOCÊ TEM?


Texto: Lucas Rosado Mendonça


Você, que está lendo esse texto aqui e agora, tem medo de cobra? Se não, você provavelmente conhece alguém que tenha. O medo de cobras (ou serpentes, como preferir) é um dos medos mais comuns entre as pessoas, em alguns levando até ao desenvolvimento de sérias fobias. Mesmo assim, nós temos uma relação muito próxima com as serpentes, a ponto de elas terem criado nosso universo ou nos feito pecar e cair no mal eterno. Se preferir, podemos citar as animações e filmes que fazem referência às serpentes, indo desde a visão apelativa para o medo, e passando pelo mistério e poder.


Mas aqui eu vou te mostrar outro aspecto que pode estar relacionado ao medo que temos pelas serpentes e, ainda assim, esse grande fascínio que temos por elas.


Figura 1. Esquema representando a localização da região Pulvinar no cérebro de um macaco. Fonte: Marques & Medeiros 2018.


O medo evolutivo?

Nós passamos e ainda estamos passando por um longo processo evolutivo, e este ainda é cheio de lacunas e mistérios, afinal, não é tão fácil estudar a si mesmo, ainda mais quando se refere ao passado distante, certo? Entretanto, temos algumas pistas e alguns caminhos bem trilhados. Um destes nos mostra que nosso medo por serpentes vem de uma história muito mais profunda do que achávamos. Nossos ancestrais, à 60 milhões de anos atrás, estavam perambulando pela floresta tentando sobreviver e fugir dos seus predadores, estes, que majoritariamente eram as serpentes constritoras (como nossa boa e velha Jiboia), como aponta a Teoria da Detecção de Serpentes.


A grande pressão seletiva provocada pelas serpentes nos direcionou evolutivamente a um aspecto neurológico diferente de outros mamíferos. Nos foi selecionado, uma região do cérebro (região Pulvinar, figura 1) que tivesse a capacidade de identificar as serpentes de forma mais rápida, a fim de evitar a predação. Esse alto desenvolvimento de uma região cerebral nos ajudou a ter esse cabeção que temos hoje. Essa região funciona muito bem na identificação de serpentes e objetos serpentiformes, de forma até mesmo inconsciente! Por isso que algumas vezes ouvimos falar de pessoas que confundiram uma linguiça com uma serpente.


Porém, o medo não vem junto com essa identificação, ele é aprendido. Sim, nós conseguimos identificar uma serpente facilmente no meio do mato ou em outro lugar, entretanto, nós não sentimos medo em primeiro momento, nós ficamos alertas, o medo vem depois. Quando nascemos somos tão bons quanto um adulto para identificar uma serpente, mas não demonstramos medo ao vê-la. Pelo contrário ficamos curiosos, fascinados e de certo modo apreensivos. Afinal, é comum ficar recuado quando não conhecemos algo. E é aí que entra o medo.


O medo vai surgir a partir da primeira experiência, caso seja negativa. Se sua experiência for boa, você não vai ter medo. Entretanto, na sociedade em que vivemos, é difícil não ter uma experiência ruim com elas, já que a todo momento somos bombardeados por histórias em que os grandes vilões são ninguém menos que as Serpentes. Ou seja, se você tem medo de serpente, ou conhece alguém que tenha, é por que provavelmente a primeira impressão (e o decorrer das experiências) não foi muito boa. Se você tiver a oportunidade, faça a primeira vez de alguém com uma serpente ser boa, ou caso você tenha medo, reconstrua a sua primeira vez com elas. Não é por quê temos essa capacidade de identificação, que precisamos temê-las.




Referências

Isbell, L. A. 2006. Snakes as agents of evolutionary change in primate brains. Journal of Human Evolution. 51: 1-35. DOI: 10.1016/j.jhevol.2005.12.01.


Kawai, N. & Qiu, H. 2019. Humans detect snakes more accurately and quickly than other animals under natural visual scenes: a flicker paradigm study. Cognition and Emotion. DOI: 10.1080/02699931.2019.1657799.


Marques, O.A.V. & Medeiros, C.R. 2018. Nossas incríveis serpentes: caracterização, biologia, acidentes e conservação. Ponto A.


Murray, J. & Foote, F. 1979. The Origins of Fear of Snakes. Behav. Res. & Therapy. 17: 489-493.

Thrasher, C. & Lobue, V. 2016. Do infants find snakes aversive? Infants’ physiological response to “fear-relevant” stimuli. Journal of Experimental Child Psychology. DOI: 10.1016/j.jecp.2015.09.013.


Van Le, Q., Isbell, L.A., Matsumoto, J., Nguyen, M., Hori, E., Maior, R.S., Tomaz, C., Tran, A.H., Ono, T. & Nishijo, H. 2013. Pulvionar neurons reveal neurobiological evidence of past selection for rapid detection of snakes. PNAS. 110(47): 19000 – 19005. DOI: 10.1073/pnas.1312648110.

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