Por Bárbara Santos Teixeira Costa
As serpentes podem estar presentes em diversos tipos de habitats, como no meio aquático, fossorial (ou subterrâneo), terrestre e arborícola. Além disso, podem frequentar não apenas um desses meios exclusivamente, mas vários de uma só vez. Entretanto, existem certos tipos de serpentes que são exclusivas de determinado hábitat, e apresentam diversas características em comum quando são encontradas nele. Esse é o caso das serpentes exclusivamente arborícolas, que possuem diversas semelhanças entre si!
Figura 1. Serpente arborícola Leptophis liocercus sobre um galho na Mata Atlântica da Reserva Biológica do Córrego do Veado. Fonte: Bárbara Santos Teixeira Costa.
Já ouviu falar das síndromes ecomorfológicas? As síndromes são um conjunto de características que permitem que um animal possa viver em um determinado habitat, exercendo diversas atividades vitais como reprodução, alimentação ou termorregulação, com maior frequência ou segurança. Uma das síndromes ecomorfológicas conhecidas para as serpentes é a síndrome arborícola, que também pode ser referida como semiarborícola, subarborícola ou arbustiva.
As serpentes arborícolas caçam e se abrigam na vegetação e apresentam um conjunto de características em comum entre si. Geralmente, apresentam um corpo delgado que facilita seu deslocamento em meio arbóreo, além de servir de camuflagem ao se assemelharem a galhos. Porém, outras serpentes arborícolas também podem apresentar uma musculatura forte e desenvolvida, que facilita para escalar grandes árvores, como a Corallus caninus (Figura 2). Nesta última espécie, também é possível observar que há a presença de uma estrutura denominada cauda preênsil, auxiliando na sua fixação entre as árvores.
Figura 2. A serpente arborícola Corallus caninus sobre um galho, note a presença da cauda preênsil no final de sua cauda. Fonte: Biodiversity4all.
No que se refere à visão dessas serpentes, esta costuma ser bem desenvolvida, com grandes olhos em uma cabeça muito destacada, como na serpente Leptophis liocercus (Figura 1). Muitas vezes, as serpentes deste habitat podem apresentar coloração esverdeada ou amarronzada, que nesse caso, é considerada uma coloração de camuflagem por entre as folhas da vegetação ou por entre seus galhos, dificultando a percepção de predadores e facilitando a caça de sua presa, que não a vê.
Em relação a seus órgãos internos, alguns autores afirmam que existem modificações em relação a serpentes que estão presentes em outros ambientes. Seus folículos geralmente possuem tamanho menor do que as outras serpentes, e dessa forma, conseguem se equilibrar em galhos finos, o que também viabiliza sua camuflagem e facilita seu movimento por espaços apertados entre a vegetação, mesmo enquanto carrega sua prole.
Além disso, essas serpentes podem possuir escamas ventrais alargadas e maior quantidade de vértebras caudais, como por exemplo a serpente Chironius foveatus. Um trabalho bem interessante que avalia o grau de arborealidade de cinco espécies do gênero Chironius é o de Banci e colaboradores (2022). Na figura abaixo, os autores demonstram o quanto uma serpente pode ser arborícola no alargamento de suas escamas, na quantidade de escamas caudais e se esta espécie costuma se alimentar mais de anfíbios arborícolas (Hylidae) ou terrestres (Leptodactylidae) (Figura 3).
Figura 3. Esquema representando o quanto cinco espécies do gênero de serpentes Chironius são arborícolas. Na legenda da figura podemos observar a seguinte frase, em tradução livre: Representação de cinco espécies simpátricas de Chironius na Mata Atlântica. Em ordem crescente de arborealidade. Resumindo suas principais diferenças interespecíficas. Na morfologia (observe o corpo, cabeça, tamanho dos olhos, robustez e o comprimento da cauda em cobras) observe as proporções do número de escamas ventrais e a densidade vertebral subcaudal. Dieta (legenda: Hylidae; Leptodactylidae). E uso do habitat representado por níveis de arborealidade (número de árvores). Fonte: Banci et al., 2022.
REFERÊNCIAS
BANCI, K. R. S. et al. Body shape and diet reflect arboreality degree of five congeneric snakes sympatric in the Atlantic forest. Biotropica, v. 54, n. 4, p. 839-851. 2022.
CADLE, J. E.; GREENE, H. W. Phylogenetic patterns, biogeography, and the ecological structure of neotropical snake assemblages. In: R. E. Ricklefs & D. Schluter (ed.). Species diversity in ecological communities: Historical and geographical perspectives. Chicago: University of Chicago. 1993. p. 281-293.
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