Texto: Bárbara Santos Teixeira Costa
As espécies do gênero Tropidodryas apresentam uma estratégia alimentar muito inusitada: a utilização do engodo caudal. Hoje, nós iremos descobrir como e o porquê delas fazerem isso.
Figura 1A: Indivíduo de Tropidodryas serra. Autoria: Otávio Augusto Vuolo Marques. Figura 1B: Macho adulto de Tropidodryas striaticeps. Autoria: Otávio Augusto Vuolo Marques.
O gênero Tropidodryas
O gênero Tropidodryas é endêmico da mata atlântica e composto por duas espécies: T. serra e T. striaticeps. Segundo Oliveira (2008), a primeira ocorre do estado da Bahia ao estado de Santa Catarina, enquanto a segunda ocorre da Bahia ao Rio Grande do Sul. Ambas são diurnas, semiarbóreas e são consideradas espécies-irmãs com base na morfologia e ecologia, apresentando sinapomorfias (caracteres homólogos compartilhados) na coloração, morfologia, osteologia e ecologia. Elas também são capazes de alternar o uso do seu hábitat, utilizando tanto o solo como a vegetação.
Porém, de acordo com Oliveira (2008), em um estudo com indivíduos de Tropidodryas em vários estados brasileiros que apresentam o bioma mata atlântica, foi visto que a T. serra habita principalmente as áreas de baixada da mata atlântica, enquanto que a T. striaticeps ocorre em suas áreas mais elevadas. Isso faz com que o conteúdo de suas dietas seja menos semelhante, o que pode permitir que ambas compartilhem espaço em áreas de simpatria, ou seja, elas suportam viver em um mesmo local devido a menor sobreposição na dieta (nicho trófico).
Dieta
A dieta das espécies de Tropidodryas inclui principalmente mamíferos, mas elas também se alimentam de lagartos, aves, anuros e serpentes. Elas apresentam uma variação ontogenética na dieta, que pode ser definida como uma variação em algum fator de acordo com o estágio de desenvolvimento do indivíduo. Os juvenis se alimentam mais frequentemente de presas ectotérmicas menores, e os adultos consomem majoritariamente presas endotérmicas, e passam a se alimentar de presas maiores. Isso acontece pois as serpentes juvenis não são capazes de subjugar e ingerir presas maiores, enquanto que as adultas são mais aptas para isso e também possuiriam um maior aproveitamento energético advindo desse consumo. Outra possível explicação seria de que serpentes com diferentes tamanhos se deslocam em diferentes hábitats, e acabam se alimentando de maneiras diferentes, com presas diferentes.
Engodo caudal
Ambas as espécies possuem uma estratégia alimentar muito interessante para adquirir suas presas, chamada engodo caudal. O engodo caudal é um movimento de contorção com a ponta da cauda, no qual possui uma cor esbranquiçada, para que uma possível presa a confunda com uma larva. Para isso, a serpente precisa possuir uma coloração críptica, no qual ela consiga camuflar-se com o substrato. Assim, a presa avista apenas a ponta da cauda da serpente, a confunde com seu alimento e assim a serpente pode se aproveitar de sua distração, predando-a. Essa técnica de alimentação pode ser vista em diversas famílias, como Boidae, Viperidae e Elapidae, porém, são raros os casos onde o engodo caudal é visto em indivíduos adultos.
Nas espécies do gênero de Tropidodryas, ambas apresentam juvenis com engodo caudal, mas apenas a T. striaticeps possui serpentes adultas com essa característica. Isso demonstra que, ao contrário de T. serra, em T. striaticeps não há uma mudança na cor da cauda que acompanha a variação ontogenética da dieta, como era pensado antigamente.
Além disso, em vários adultos de T. striaticeps é possível observar que a cauda se encontra danificada, isso porque as presas atraídas por engodo caudal podem acabar danificando a cauda da serpente, pois a confundiram com seu alimento. O que é mais uma evidência de que os adultos dessa espécie seriam capazes de realizar o engodo caudal.
Referências
OLIVEIRA, F. S. Ecologia alimentar e reprodutiva de duas espécies de Tropidodryas (Serpentes, Colubridae) da Mata Atlântica. Dissertação (Mestrado em Ecologia) - Universidade de São Paulo, Instituto de Biociências. p.113. 2008.
SAZIMA, I.; PUORTO, G. Feeding technique of juvenile Tropidodryas striaticeps: probable caudal luring in a colubrid snake. Copeia, v. 1993, n. 1, p. 222-226, 1993.
STENDER-OLIVEIRA, F.; MARTINS, M.; MARQUES, O. A. V. Food habits and reproductive biology of tail-luring snakes of the genus Tropidodryas (Dipsadidae, Xenodontinae) from Brazil. Herpetologica, v. 72, n. 1, p. 73-79. 2016.
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